Shoppings, hotéis, hospitais e lojas conhecidas tem fragrâncias próprias

Marketing do olfato

RIO – Alguns cheiros e lugares que são inseparáveis. Pipoca e cinema, cloro e piscina, incenso e feira hippie, gasolina e posto de gasolina. Isto posto, veja se consegue ligar o seguinte perfume a um conhecido cenário carioca: “Notas amadeiradas que possuem suavidade elevada e sofisticação, combinadas com alecrim, bergamota, limão e mandarina.” Bem, esta é a descrição olfativa da fragrância exclusiva Folhas do Brasil, desde 2015 produzida pela empresa Cheiro Bom para o Shopping RioSul, em Botafogo. O objetivo é borrifar pelos corredores do centro comercial “a refrescância das folhas verdes e madeiras” e criar “um ambiente fresco, vívido e harmonioso”, que “convida para entrar e faz você se sentir bem-vindo”.

É uma viagem. E é o que se chama de marketing olfativo, nome nada charmoso para a arte de traduzir em fragrância a identidade de uma marca — e, com sorte, ganhar seus clientes pelo nariz.

O conceito surgiu nos Estados Unidos, chegou ao Brasil nos anos 2000, e hoje está no ar de conhecidíssimos endereços cariocas, como a lojas Renner, Lojas Torra Torra, Havainnas. O conceito também é aplicado a ambientes que, na teoria, não fedem nem cheiram, como hospitais e escritórios. E saiba: o cheiro da padaria pode não ser de pão, mas essência de baunilha.

Não funciona com todo mundo. No próprio RioSul, a empresária americana Stephanie Miller, de férias no Rio, racionaliza:

— Senti o perfume quando entrei. Se é para dar um clima tropical, deu certo.

RioSul. Fragrância do shopping é de notas amadeiradas com folhas verdes – Fernando Lemos / Agência O Globo

Os cassinos de Las Vegas foram os primeiros a farejar os benefícios do marketing olfativo, ainda nos anos 1990, conta Sue Phillips, fundadora da Scenterprises (trocadilho com scent, “perfume”, e enterprise, “empreendimento”). De Nova York, a empresária que já trabalhou com Lancôme, Tiffany e Burberry conta por e-mail que o objetivo inicial era atenuar o mau cheiro do cigarro dos apostadores. Mas logo os perfumes acabaram se tornando “a cara” dos cassinos, estimulado inclusive a permanência dos clientes.

Como todo grande cassino de Las Vegas também é um hotel, o perfume customizado se espalhou naturalmente de um ambiente para o outro, chegando a grandes redes internacionais.

Os alquimistas da mercadologia do olfato se fiam em pesquisas que garantem a influência de certas fragrâncias sobre o cérebro humano. Dizem estudos que o perfume certo pode projetar familiaridade em um apartamento à venda, fazer o tempo passar mais rápido no banco e até convencer você de que suou mais na academia. Verdade ou não, segundo estimativas da Scenterprises, é um mercado global de US$ 200 milhões, que cresce 10% ao ano.

Não há estimativas para o Brasil, mas o setor conta com várias empresas nas maiores capitais. A Cheiro Bom, de São Paulo, atende desde grandes lojas de departamento como a Renner (descrição olfativa: “toque fresco e leve, combina acordes florais e cítricos”) a hospitais como o Albert Einsten (“delicada fragrância que relembra a infância”). Yasmin Esperanza, gerente de marketing da Cheiro Bom, é filha dos fundadores Ricardo e Lilian. Ela comenta:

— Nasci no meio de perfumes e adoro andar perfumada. Acho que todo mundo que trabalha com isso acaba ficando cheiroso também.

Clientes menores podem optar por fragrâncias preexistentes no portfólio das empresas. Tanto lojas de chocolates quanto cafeterias costumam recorrer a um aroma de chocolate. Padarias também se perfumam — é conhecido o caso de uma rede de supermercados gaúcha cujo setor de pães é sucesso não pela farinha ou pelo fermento, mas pela instigante essência de baunilha.

Não é de hoje a união de marcas e fragrâncias no mundo da moda — no início do século XX, o estilista francês Paul Poiret já borrifava suas coleções. Hoje, o cheiro das grifes é um passaporte para a alta-costura: você não sabe quando vai poder comprar um Dior ou um Armani, mas um perfume até que rola.

Com o advento da identidade olfativa, a loja inteira ganhou cheiro — compondo, com decoração e trilha sonora, a experiência total do marketing sensorial. Na onda de Abercrombie & Fitch e Zara, marcas cariocas seguiram a tendência.

— Cerca de 80% das compras são emocionais, e boa parte dessa emoção vem do olfato. É uma maneira de forjar um vínculo, acariciar o consumidor.

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